Cariocas que disfarçam o sotaque

Quando um repórter carioca fala no rádio, é comuníssimo ele se esforçar para não chiar o S em fim de sílaba. Devem receber instruções de fonoaudiólogo para falar "sem sotaque". Se você nunca percebeu isso, perceba agora com a jornalista global Christiane Pelajo, que é um exemplo fácil. 

Nos primeiros segundos já se verifica a oscilação entre chiar e não chiar. Faço a transcrição para facilitar. 
Uso "ch" para representar o som chiado surdo carioca (apesar de nem sempre ser idêntico ao som de chato), "j" para o chiado sonoro (parecido com o som de jato, mas nem sempre idêntico a ele), "ç" para a sibilante alveolar surda (praça) e "z" para a sibilante alveolar sonora (prazo).

(...) não poderia echtar a serviço em São Paulo, e echtava a menoj de quarenta metroç da vítima. 
Em Cuiabá foram presoç treij dos segurançaj num shopping que echpancaram um vendedor ambulante.

No trecho começando em 0:46 :


A inflação do meich passado foi a menor em três anoç. O IPCA...


A gente vê que a apresentadora às vezes chia como a carioca que é, e às vezes não. Existe um padrão nessa oscilação? Sim, existe! Para começar, ela nunca deixa de chiar dentro de palavra, como em estar e espancaram. Só ocorre uma exceção no vídeo, Battisti (de Cesare Battisti), que não conta, porque ela está reproduzindo a pronúncia italiana. A prova é que ela também não pronuncia "ti" como \tchi\.


Uma segunda tendência é não chiar o S quando está em fim de enunciado. Isso se vê no segundo trecho, fechado por anos, pronunciado sem chiado. Mês, que está no meio do enunciado, é chiado. 


Por fim, a apresentadora tem tendência a não chiar quando está dando ênfase à fala. Essa parece ser a explicação para o não chiado de metros e presos no vídeo. 


Essas tendências podem ser sintetizadas numa só: a autora não chia o S quando está atenta e chia quando está relaxada. É que, quando o S está fechando a fala, ele está em foco; o S dentro de palavra  chama pouco a atenção e por isso escapa ao controle consciente do falante. Eu mesmo, quando estou imitando um sotaque português ou carioca, também tendo a escorregar nesses S's, só que ao contrário, porque o meu natural é não chiar em palavras como espancar.


Essa análise prova que, como tantos outros jornalistas conterrâneos, Christiane Pelajo pena para disfarçar o sotaque. Mas mesmo aqueles que conseguem eliminar o chiado (ao contrário de Cristiane) podem fracassar no objetivo maior, porque, ao contrário do que eles pensam, o chiado não é o único aspecto do sotaque carioca. Tem outros, que os entregam rapidamente.  


Quando se fala no assunto, muito se diz que o dialeto carioca é o padrão falado do Brasil, o sotaque de referência, assim como o sotaque de Lisboa em Portugal, o de Paris na França e o de Oxford na Inglaterra. Ora, como é que pode ser, se os cariocas se esforçam para eliminar o sotaque quando falam no rádio e televisão? O que define a fala padrão é justamente ser considerada a melhor para se ouvir na mídia. O sotaque carioca, pelo visto, não é.



31 comentários:

  1. "O que define a fala padrão é justamente ser considerada a melhor para se ouvir na mídia. O sotaque carioca, pelo visto, não é."

    Mas isso quem define não é o repórter, e sim a direção jornalística da emissora. Você acha que eles chegam pedindo por livre e espontânea vontade para perder o sotaque? Você mesmo disse, o chiado é apenas uma das características do sotaque. Todo o resto está ali e eles não fazem a mínima questão de retirar. Só tentam amenizar o chiado porque essa é a marca registrada, é o que chama mais atenção. Se a idéia é de passar um sotaque neutro, obviamente que eles iam retirar o que mais faz lembrar o sotaque do Rio. E mudanças aconteceriam em qualquer sotaque. Por exemplo: você acha que um jornalista paulista se fosse apresentar o JN iria falar aqueles "éintos" pavorosos? E outra, o Bonner é paulista, e fora a falta do chiado, o sotaque é basicamente carioca.

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    2. Bonner não é um ser supremo que dita como o português brasileiro deve ser pronunciado. Já basta os chiliques, faniquitos e siricuticos desproporcionais que ele dá sem desenvoltura alguma quando algo dá errado ao vivo. Sem jogo de cintura. E Globo tenta impingir a pronúncia errada de "recorde" (é) há séculos enquanto as outras emissoras pronunciam a palavra corretamente (ê) sem parecer anglicismo que mais soa como se um memorando tivesse sido passado à todos para evitar a pronúncia próxima do nome da emissora Record em português. Vários repórteres da Globo pronunciam gratuito, intuito, circuito e fortuito incorretamente. Além da pobreza de vocabulário de jornalistas de todas as emissoras em casos como "fez o acidente, fez o homicídio, botou fogo" ao invés de ocorreu/causou/induziu, cometeu e ateou. Isso sem mencionar a garota do tempo Maju que diz "chuvica", "granizaiada" (sic) e "quentura"

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  2. Nossa. O sotaque carioca é horrivel, chato e chegar a dar nojo. Os reporteres da Globo deveriam se esforçar para falar o padrão. Eu posso, qualquer um pode. Todas as pessoas no país tem que engolir esse sotaque carioca chega a doer os ouvidos.

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  3. Sempre tem um ardidinho hateando o sotaque carioca (que, vale lembrar, é o sotaque oficial brasileiro - pesquisem e aceitem). Durma com esse barulho aí, E (de estúpido, imagino) Zampieri LOL

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    1. Isso foi em 1954. A tendência já não é mais essa.Observe que nem s nem R tão característicos do Rio estão presentes no padrão.

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  4. Invejinha do Rio.. falamoxxxx assim mexxxmo... Vocês têm que engolir!!!!

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  5. A Cecília Malan (correspondente em Londres) é uma das piores. Faz até biquinho pra falar. - Leilane Neubarth é outra insuportável. Os telespectadores não são só cariocas, e os jornais exibidos em rede nacional não são um RJTV da vida. Os editores responsáveis deveriam alertar todos os jornalistas amantes do sotaque a ~se controlarem.

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  6. E falar puxando o "R" igual a um caipira, como os paulistas fazem (interiorrrrr, liquidificadorrrr). Vocês tem que saber uma coisa o sotaque carioca é o padrão, é o mais proximo do portugues nativo, herança dos dos portugueses se instalaram aqui no Rio em 1808, gostando ou não essa é a verdade.

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    1. Sou de SP e não falo assim!
      Tampouco se vê no jornalismo os R e s cariocas.
      Esquece que o sotaque padrão não é mais o do Rio.
      Existe um padrão que não é de nenhum lugar.

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    2. Nem todos os Paulistas falam assim. Eu mesma não falo.
      O sotaque carioca não é mais padrão já faz uns anos.
      Existe um sotaque padrão neutro que não é de nenhum estado específico.
      Se o padrão fosse carioca , onde estão os R e s tão característicos de vcs no jornalismo ?

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    3. Carioca não puxa o R quem puxa o R são os paulistas, os cariocas puxam o S.

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  7. O sotaque carioca não é o original e mais próximo do lusitano original. O português brasileiro é foneticamente mais conservador que o de Portugal que se tornou inovador no século XIX. Os brasileiros pronunciam a maioria dos fonemas como Pedro Álvares Cabral fazia. O português brasileiro é mais próximo do seiscentista e é uma falácia e sofisma a influência indígena e africana que se resume a apenas alguns vocábulos na africana e aos topônimos cunhados pelos jesuítas e fauna e flora no caso do vocabulário tupi-guarani. O chiado fricativo e redução pré-tônica do sotaque carioca são inovações. Esta é a razão de serem rejeitadas pelas demais regiões do país. Um repórter especialmente de notícias nacionais e internacionais não pode possuir sotaque carregado pois se torna ruído que distrai. Um profissional sério tentaria neutralizá-lo. O sotaque paulistano (capital) e da seção oriental e litoral paulista não possuem o R retroflexo caipira que sofre muito preconceito por sua vez. O sotaque carioca não é o padrão uma vez que é rejeitado. Uma reunião nos anos 50 para definir pronúncia em teatros não conta no século XXI. Os atributos regionais do sotaque carioca são inovações. E quanto ao gerúndio e "enta"/"ento" paulistanos, caso não saibam, as línguas neolatinas tem tendência à nasalização e o português já possui vogais nasais assim como o francês.
    A maioria das afirmações sobre o português brasileiro são mentiras não corroboradas pela metodologia acadêmica utilizada em publicações de PhDs. Mentiras como a língua geral ter substituído o português ou nossa fonética possuir influência africana. Tudo isto está publicado nos livros Origens do Português Brasileiro de Scherre e no livro que compila estudos sobre o PB publicado por Volker Noll.

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    1. A prova de que o português brasileiro é mais foneticamente conservador é o fato de que a métrica de Camões só funciona com a pronúncia brasileira. Decassílabos etc.

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    2. O francês canadense e o inglês americano também são mais conservadores. Os britânicos mudaram a pronúncia do R ou a perderam no século XIX. A colônia conserva formas mais antigas do que a metrópolis. Foi assim no Império Romano e esta é a razão pela qual o Nordeste brasileiro possui as formas arcaicas entonce para então e despois para depois. Arcaísmos.

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    3. Você é Paulista? Se for ta explicado o motivo de não notar o excesso de "R" na pronuncia paulistana, pra mim que sou carioca, fica bem claro toda vez que tenho que ir na cidade de São Paulo.
      Do mesmo jeito os paulistanos notam dos cariocas os excessos de "S" e nós somos incapazes de notar.

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    4. Concordo com tudo que você falou, exceto que a fricativa /ch/ é uma inovação do dialeto carioca. Não é. A maioria dos falares lusitanos, o S final e pré-consonantal é pronunciado "chiado", igual ao carioca. Um outro detalha. Não é só o carioca que "chia". O Catarinense do Vale do Itajaí chia (herança açoreana), o Paraense chia, e no Nordeste, podemos ouvir o chiado nos falares pernambucanos, por exemplo. O chiado não é exclusividade carioca.

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    5. Estou ciente das regiões com chiado,eu quis dizer que as regiões que não possuem a fricativa, a palatalização do plural e S em final de sílaba pré-consonantal (péish, bouash, pashtor, poshto) e a redução pré-tônica (murangu, lião, acadjimia, tioria, puliça) e ditongação como em measa, boua, péish, são mais conservadoras. Pedro Álvares Cabral e Camões não chiavam. O chiado em Portugal e no Brasil são inovações.

      O nosso R costumava ser como o espanhol, então Pedro Álvares Cabral pronunciaria o R vibrado em "Terra à vista", mas jamais vishta. As vogais lusitanas eram como as nossas, destacadas, enfáticas e não suprimidas. A queda das vogais e o schwa lusitanos são inovações do século XIX.

      O R retroflexo caipira existe apenas no interior paulista, norte do Paraná, regiões de Minas e Goiás e recebem discriminação social especialmente no Rio, enquanto o preconceito lingüístico tenha caído nas outras regiões em relação ao retroflexo que soa como o R Americano enquanto o inglês britânico aboliu o R se tornando não-rótico.

      Quanto ao R paulista e paulistano, estes seguem a pronúncia básica do R quando inseridos entre as sílabas. O alveolar flap/tap pronunciado em porta, parada e arara é o mesmo de Portugal, do Sul, Centro-Oeste e partes do Nordeste. O carioca ou fluminense com a pronúncia uvular de porrta e amorr (pohta, amoh) é quem inovou. O francês e alemão também inovaram no R.
      Mas o Brasil seguiu a inovação de ter R velar apenas no início da palavra e no R duplo casos de rato, rua, rei, terra, carro, terraço etc. Nosso R costumava ser vibrado como o hispânico há séculos atrás. Hoje o português lusitano também modificou o R em muitas regiões, alterando do vibrado para o velar. Em algumas regiões fronteiriças do Rio Grande do Sul o R vibrado existe por influência dos vizinhos hispânicos.

      A pronúncia carioca possui mais inovações do que muitas partes do Brasil, portanto não é padrão pois além de não possuirmos regional padrão e sim possuirmos apenas um padrão que tenta ser neutro sem sotaque, essa idéia de padrão foi apenas nutrida nos anos 50 para teatro pelo Rio ser a antiga capital.
      Ninguém infere o carioca como padrão tanto que a Cecília Malan é rejeitada como exagerada e desrespeitosa pois o sotaque é ruído que distrai da notícia.
      Não se trata de preconceito com o Rio e sim de respeito. Nenhum jornalista nascido em região de sotaque caipira dá notícias internacionais ou nacionais com o R retroflexo caipira. O paulista de Birigui Reynaldo Gianecchini e a paranaense Grazi Massafera fizeram cursos para perderem seus sotaques caipiras nativos.

      Luciano Huck por pertencer à comunidade judaica parece ter sotaque mais nasalado do que a pronúncia regional paulistana, tanto que é zombado por paulistas e paulistanos. Talvez se trate de influência do iídiche mas a questão é que ele não é jornalista. Se Luciano Huck fosse noticiar eventos internacionais ele teria que perder o forte sotaque regional. William Bonner é neutro.
      O centro de monitoramento da Globo já registrou muitas reclamações sobre a pronúncia insana e incrivelmente exagerada de Cecília Malan, coisa que seu pai, o ex ministro Pedro Malan não tem.
      Por outro lado, outra que recebeu muitas reclamações pela fala nasal e esganiçada além de falta de tato com sorrisos e maneirismos agitados ao dar notícias tristes e graves era a ex jornalista bahiana da Bandeirantes que depois foi ser apresentadora no SBT Ticiana Villas Boas, mulher de Joesley Batista, da JBS. Ticiana foi apelidada de rainha do camarote após dar entrevista à Veja dizendo não saber quanto custava a gasolina pois possuía chauffeur. Ticiana queria ser jornalista televisiva e por isso Joesley comprou seu espaço na bancada da Bandeirantes com publicidade da Friboi. Após muitas reclamações de seus trejeitos, Silvio Santos a contratou e alta verba publicitária da Friboi migrou para o SBT. Ticiana ficou mais feliz por se tornar apresentadora.

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    6. Acho um desserviço da Globo a tentativa de impingir a pronúncia errada de recorde como récorde enquanto todas as outras emissoras pronunciam rêcorde. Globo já tentou lançar eu te gosto muito, além de possuir repórteres que não sabem pronunciar gratuito e circuito corretamente.
      A garota do tempo Maju lançou livro dizendo que vão ter que engolí-la dizendo chuvica ao invés de chuvisco, quentura ao invés de calor, chuvarada carrancuda, Cuiabrasa e friaca do caraca. Mas o pior foi granizaiada, pois não se trata de inovação mas de erro pois não existe I nessa formação e sim LH, granizalhada. O correto mesmo seria saraivada de granizo ou tempestade de granizo.

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    7. O s chiado de Portugal, Rio, Nordeste e litoral catarinense é recente sim. Se vê pela grafia das palavras e pelas outras línguas e dialetos românicos neo-latinos que pronunciam o S como os paulistas e outros sulistas. A ausência de s no plural em substantivos e adjetivos, só marcando o plural nos artigos tbm existe no francês q escreve mas não pronuncia o s e no espanhol da Colômbia, Venezuela, América Central, México e Caribe eles não pronunciam o s em alguns casos.

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  8. Tudo muito bem explicado, muito bem embasado, mas essa discussão não terá fim. O Brasil é um país continental, portanto com inúmeras influências culturais -logo linguística - e essa coisa de forma padronizada de pronúncias não passa de mera vaidade regional. O dia em que eu estiver em algum lugar deste Brasilzão e não conseguir pedir um pão com manteiga e café com leite, então ficarei preocupado.

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  9. Falar certo ou errado nada tem que ver com pronúncia, sotaques ou vocalizações. É ridículo pensar assim. "Nós vai", "Nós fumo", isso sim é falar errado. Sotaques são simples regionalismos, o "charme" de cada rincão desse país chamado Brasil.

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  10. Acho lindo o jeitinho dela falar💗

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  11. Me incômodo com o exagero de qualquer sotaque, o erro de português é bem pior!

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  12. Eu digo cada um fala do seu jeito , eu acho orrivel falar mal de outro sotaque , isso é coisa de brasileiro ignorante e sem mínimo de inteligência .
    O chiado é um trato do sotaque carioca.
    Eu acho lindo o sotaque carioca

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  13. Cada um tem que falar com sotaque de sua terra e pronto, não gostou tão em os ouvidos

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  14. uma coisa que percebo olhando vídeos antigos dos anos 60, (Reporter Esso, Festivais da Record, Jornal Nacional etc) é que o sotaque paulistano de antigamente, o da capital, era o usado pela mídia. Ele tinha como característica ser falado próximo como se escreve, sem as nasalizações de hoje nos "en" e "ão" e sem as palatizações nos "ti" e "di", sendo tais sílabas pronunciadas como se escreve, numa clara influência italiana. A única característica marcante deste sotaque era a pronúncia do R vibrante, estilo Galvão Bueno. Esse sotaque original ainda hoje é percebido em paulistanos mais velhos, como Faustão, Maluf etc.

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  15. Essa pronúncia é o português antigo, não um paulistano italianado. É q coincide as pessoas mais antigas e os filhos de imigrantes italianos usarem misturando. Mas já na década de 20 e 30 era impostada e artificial como quando a Carmen Miranda canta "um rrrrosário de ouro".

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