A pronúncia de emagrecer


Quando o grande lexicógrafo português Gonçalves Viana fez sua proposta de ortografia, quis grafar algumas palavras com MM e NN: emmagrecer, emmalar, ennegrecer, emmoldurar, ennobrecer, innato, innovação, immigrante (mas emigrante). São todas palavras com o prefixo in- ou seu derivado português en-, indicando movimento para dentro. Em cada dupla MM ou NN, a segunda letra seria efetivamente pronunciada, enquanto a primeira serviria apenas para nasalizar a vogal precedente (como ocorre em palavras como impressão, índio, tempo ou vencer). 

Essa proposta de Gonçalves Viana foi adotada em Portugal de 1911 até 1945, quando, para combinar com o Brasil, cortaram as letras extras e ficou emagrecer, emalar, enegrecer, emoldurar, enobrecer, inato, inovação, imigrante. 

No Brasil, nunca cogitaram escrever emmagrecer. A ideia deve ter sido que, para os brasileiros, já é natural nasalizar qualquer vogal antes de M e N, ao contrário de Portugal. O E de emagrecer seria pronunciado nasal de qualquer jeito.

De fato, numa fala natural, um brasileiro fala a palavra como "im-magrecer" (com I nasal). Mas e quando a pessoa está lendo a palavra de um teleprompter e escandindo as sílabas? William Bonner mostra o que acontece: ele fala "ê-magrecer", com o E nada nasal. Se a grafia fosse emmagrecer, como queria Gonçalves Viana, o apresentador sem dúvida falaria "em-magrecer", nasalizando o E. Ou seja: nesse caso, a escrita influencia a fala, à revelia das teorias dos linguistas.

Deveríamos ter seguido a prescrição de Gonçalves Viana e escrito ennobrecer, innovar e immigrante. Mesmo que não fizesse diferença para os brasileiros (como vimos, faz sim), mas, se faz para os portugueses, deveríamos ser leais e escrever os Ms e Ns a mais. Afinal, eles se dispuseram a escrever um C mudo em "tecto" na crença de que alguém no Brasil ainda o falava...

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