Por que é que VÊEM tinha acento em primeiro lugar?


Quando o Acordo Ortográfico em 2009 tirou o acento de vêem, muita gente se perguntou pela primeira vez por que é que aquela palavra jamais teve acento. Se não houvesse o acento, parece que era pronunciada da mesma maneira.


A resposta é que tinha acento pra se diferenciar de VEEM, uma forma que só existe em Portugal, e que pode ser pronunciada de três formas: /vẽẽj/, /vẽjẽj/ ou /vãjãj/. No Brasil, "têm" (a forma do plural) é pronunciada exatamente igual ao singular "tem", mas em Portugal há gente que pronuncia o plural de forma diferente: dizem ELA VEM/ELAS VEEM, ELAS TEM/ELAS TEEM. Na primeira ortografia de Portugal, vêm era escrito VEEM, com dois Es, para se diferenciar de VEM, e puseram acento em VÊEM para diferenciar a pronúncia das palavras. Mas em 1945 foram combinar com o Brasil pra escrever a palavra de uma só maneira em toda parte, e acordaram que iam escrever VÊM, com um acento em cima do E. Decidiram que não iam mais escrever VEEM, mesmo que pronunciassem a palavra dessa forma (alguns pronunciam, outros não). Nesse ponto já podiam ter tirado o acento de VÊEM, que não era mais necessário, mas, por algum motivo, quiseram manter. E por isso ficamos com esse acento inútil até 2009, quando perdemos ele para simplificar a ortografia. 



E VÔO, então, por que é que tinha acento?


Existia uma justificativa para o acento em VÊEM, mas no caso de VÔO só resta a perplexidade.

O acento de veem servia só à pronúncia portuguesa; na pronúncia brasileira ele era desnecessário, mas a ortografia do Brasil adotou mesmo assim. Já voo, enjoo, perdoo etc. não tinham razão para serem acentuados, tanto que os próprios portugueses nunca acentuaram essas palavras desde 1911. É um mistério por que a Academia Brasileira de Letras quis instituir esse acento, à revelia da prática portuguesa.


Talvez tenha sido por questão estética ou de tradição; a escrita brasileira pré-1943 (quando veio a primeira reforma) gostava de usar acentos para marcar hiatos, um hábito que deixa vestígios em muitos nomes próprios escritos até hoje à moda antiga: Corrêa, Andréa, Baêta.

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